domingo, 28 de junho de 2009

Pelo teatro visual

foto Cris Prim

A escritora e diretora de teatro Ana Maria Amaral fala das tendências contemporâneas


Terminado o festival, ficam as conversas e entrevistas com grandes nomes do teatro de animação para dar vida ao blog. No penúltimo dia de festival, Ana Maria Amaral, do grupo O Casulo - BonecObjeto (SP), foi a entrevistada pela equipe. Escritora de três livros sobre teatro de animação, ela é leitura obrigatória entre os estudantes de teatro. Também pudera, ela está sempre atualizada e vivenciando as tendências, o que é reconhecido em nível mundial. O espetáculo "Dicotomias, Fragamentos Skizofrê", que tem roteiro e direção de Ana Maria, ganhou, recentemente, o prêmio de melhor criação artística no 12º Festival Mundial de Teatro de Bonecos de Praga, República Checa, país onde o teatro de marionetes tem grande importância. Confira.

Na sua opinião, porque o teatro de animação causa tanto encantamento?
Ana Maria: A gente se reflete no boneco, por isso ele nos causa tanta magia. É como nos vermos projetados numa fotografia. Mas não paramos para pensar que ver uma folha morta é a mesma coisa: é a energia da natureza, que está também nos objetos. Um exemplo é a sucata que leva a materialidade do ferro. Temos que parar de pensar o homem como o centro do universo. Por que não ser o centro um sapato velho (e quando falo isso dizem que estou marretando os bonecos!). Ainda existem os símbolos, que carregam algo maior, abstrato. Unindo tudo isso, é o teatro de animação.

Como o teatro de animação se manifesta hoje?
Ana Maria: Hoje o teatro de boneco é biológico – centrado no animal e no homem - e artesanal – de feitura material, com corporeidade. E o que acontece hoje em dia é uma enchente de imagens. Estamos fugindo da racionalidade. Ocorre a transmissão de informação através da imagem e do virtual, sem corporeidade. Meu filho faz cinema de animação e não entendo como aquele boneco está lá, existe, não existindo, mas existindo. E assim acontece o teatro, visual, como o “Dicotomias”, que as pessoas dizem que não tem pé nem cabeça. Mas tem, só não estão nos lugares esperados. Não é entender, é sentir. Não é o que entende racionalmente, porque o teatro é emoção.


Então a tendência no teatro é seguir o que já dita a dança e a música contemporânea?
Ana Maria: As pessoas no teatro ainda querem historinha. Existe uma dificuldade de admitir um teatro mais visual, surrealista, concretista. Vamos ver que o teatro não realista é o normal na vida de hoje! O super-realismo está na sala, na TV. Quem quer isso que vá assistir novela.

E o que é o teatro visual?
Ana Maria: Não é o uso do boneco, o que foi feito por Kantor (1915-1990) – o uso do manequim – em 1950. O que está entrando pela cabeça, pelo nariz, pela boca são as imagens e as pessoas não assimilam. No teatro visual, tem que abrir o coração para a emoção.

Existe uma co-autoria do espectador no teatro visual?
Ana Maria: Sim, e a vida é assim. Eu olho para uma sala e vou me ater a uma coisa, outra pessoa em outra e cada um de um jeito. Um exemplo: olho e vejo uma camisa vermelha, outra pessoa vê o que tem em baixo da camisa – o peitoral-, outro a etiqueta da camisa. Agora pergunto: porque o teatro tem que ser fechado se têm luz, movimento, cenografia?

(jornalista Letícia Kapper/ SC-JP 2526)

Saiba mais sobre Ana Maria Amaral

Graduada em Biblioteconomia pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (1956) e em Filosofia, pela Universidade de São Paulo (1952), é mestre em arte pela Universidade de São Paulo (1983) e doutora em artes cênicas pela mesma instituição (1995). Atualmente, é professora aposentada da Universidade de São Paulo, desenvolvendo atividades como diretora e dramaturga em teatro de animação através do grupo O Casulo - BonecObjeto, filiado à Cooperativa Paulista de Teatro. Tem ampla experiência na área das Artes Cênicas, particularmente na área de Teatro de Animação e sua relação com o trabalho de ator.

Livros publicados
“O ator e seus Duplos”, São Paulo: Edusp/SENAC, 2006. v. 1. 159 p., na 3ªed.
“Teatro de Animação”, São Paulo: Ateliê Editorial, 2006. v. 1. 126 p., na 3ªed.
“Vida de Boneco”, São Paulo: Boticário, 2006. v. 1. 208 p.

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